Cheques menores e investimentos são meios para atravessar período de desaceleração, apontam especialistas
As previsões de menos investimentos para as startups em 2022 se confirmam, com a aproximação do fim do primeiro semestre. Segundo dados da Distrito, o total aportado nos cinco primeiros meses do ano foi de US$ 2,6 bilhões em 282 rodadas, enquanto no mesmo período de 2021 foram investidos US$ 3,2 bilhões em 350 rodadas. No entanto, para alguns especialistas, os números não justificam o alarmismo que toma conta do mercado.
Essa é a opinião, por exemplo, de Orlando Cintra, fundador e CEO do grupo de investimento-anjo BR Angels, que realizou 21 aportes em apenas 30 meses – uma média de R$ 1 milhão por mês destinado à startups de diferentes segmentos. Para ele, a comparação do momento atual com o cenário de recorde de 2021 é insensata.
“O ano de 2021 foi fora da curva, com mudanças na economia refletindo em mais dinheiro para o ecossistema de inovação e maior liquidez. Já em 2022, estamos enfrentando desafios com a inflação no Brasil e a situação macroeconômica devido à guerra na Ucrânia e problemas em algumas cadeias de abastecimento, por exemplo. Isso não quer dizer que os aportes irão parar, mas que talvez seja necessário fazer propostas mais realistas e oferecer algo além do capital financeiro”, diz.
“Isso tudo tem um lado positivo. Com circunstâncias mais difíceis, as startups precisam rever suas estratégias, buscando maximizar o valor do capital e onde aplicá-lo. Os investidores também ficam mais criteriosos, o que faz com que a qualidade das startups incentivadas aumente. Logo, há uma crença de que a nova safra de startups que vêm por aí será ainda melhor, mais pé no chão, com um modelo de crescimento mais sedimentado, menos sonhadora e sem a mentalidade de ‘a gente capta o dinheiro e depois vê o que faz”, completa Cintra.
O papel do investidor-anjo
O mesmo estudo da Distrito indica que captações early stage são a bola da vez. Desde o início de 2022, ocorreram 37 rodadas com tíquete médio de R$ 3,5 milhões, frente a apenas três captações late stage, para negócios mais consolidados. Neste contexto, o investimento-anjo, em que pessoas físicas direcionam seu próprio capital para negócios promissores, ganha destaque. De acordo com pesquisa BR Angels/Abstartups, essa é a modalidade preferida de metade dos empreendedores brasileiros.
Para Maria Rita Spina Bueno, Diretora Executiva da Anjos do Brasil, organização sem fins lucrativos de fomento ao investimento-anjo e apoio ao empreendedorismo de inovação, a fatia do ecossistema em que os anjos atuam é menos afetada pela desaceleração.
“Buscando uma perspectiva mais realista e entendendo que os resultados para startups e seus investidores são de longo prazo, essa dita ‘desaceleração’ tem pouco impacto no espaço que atuamos no ecossistema. Embora ainda estejamos abaixo do nosso potencial em investimento, tanto os VCs quanto os investidores-anjo brasileiros estão capitalizados e com muito apetite para apostar em inovação. Se olharmos os números de investimento 2021 e 2022, descontadas as mega rodadas, vemos que os investimentos continuam acontecendo”, afirma Maria Rita.
“Movimentos de ajuste são esperados em startups e não acontecem somente hoje, mas estão na base desse tipo de negócio. Minha visão é que investidores-anjo estão e irão continuar apoiando negócios inovadores e que trazem respostas efetivas para grandes problemas existentes”, acrescenta a Diretora Executiva da Anjos do Brasil.
“Em grupos de investimento-anjo, além do incentivo financeiro, prezamos muito pelo aspecto intelectual. O Smart Money ocorre por meio de aconselhamento em áreas específicas, ativação da rede de relacionamento dos associados, insights para o posicionamento do negócio, enfim, é uma verdadeira indicação do caminho das pedras para os empreendedores. Foi uma ótima surpresa constatar na nossa última pesquisa que o impacto do smart money foi positivo para mais de 70% deles”, afirma Orlando Cintra.
Evento para o ecossistema
Para discutir mais a fundo essa tendência de junção entre capital e inteligência, a Anjos do Brasil promoveu o Congresso de Investimento-Anjo 2022. O evento, patrocinado pelo BR Angels, foi realizado no dia 23 de junho, das 9h às 18h, em São Paulo, e contou com a presença de importantes players, como André Barrence, Diretor Google for Startups; André Gouvinhas, Diretor de M&A e Novos Negócios na 2TM – Mercado Bitcoin; Paulo Deitos, Co-fundador da Cap Table; dentre outros.
Na palestra “O que a análise dos valuations está nos mostrando?”, o especialista em dados da Astella Investimentos, Cassio Azevedo, desmistificou o papel desse diagnóstico na tomada de decisão para um investimento em startups.
“Nossa filosofia parte da premissa que, dado o nível de incerteza dos investimentos em startups, não é preciso fazer o processo de valuation – geralmente descrito por uma análise de fluxo de caixa descontado. Nós fazemos o que chamamos de precificação por taxas base – base rate investing. Por fim, acho que quando o mercado se reajusta, reduzindo as expectativas dos investimentos, o custo das opções também cai, favorecendo maior diversificação. E lembrando: nessas safras de reajuste que geralmente têm as melhores oportunidades de investimentos em termos de risco-retorno”, conclui.
Fonte: www.jeonline.com.br