Investimento em agtechs de alimentos cresce 85% em relação a 2020

As startups do setor agropecuário que trabalham com tecnologia aplicada a alimentos no segmento depois da fazenda, chamadas agfoodtechs, receberam no último ano 85% a mais no valor de investimentos global em relação a 2020. No mesmo período, tais empreendimentos mostraram seu protagonismo no ecossistema de inovação da América Latina ao duplicar seu tamanho. As startups lideradas por mulheres na América Latina também registraram um aumento de 100% no índice de venture capital no primeiro trimestre de 2022, em comparação com o ano de 2019 (leia matéria).

Esses dados fazem parte da edição 2022 do mapeamento Radar Agtech Brasil que este ano revela panoramas inéditos sobre o protagonismo feminino no empreendedorismo agtech, e o potencial da América Latina no ecossistema de inovação e para investimentos venture capital (capital empreendedor). Além de uma lista, com o link de cada agtech catalogada por segmento, categoria, unidade da federação e cidade, e um capítulo com as considerações finais e perspectivas do setor agtech brasileiro.

No Brasil, as agtechs que desenvolvem soluções para resolver problemas depois das fazendas, principalmente com alimentos inovadores e novas tendências alimentares, também são numericamente maiores, representando 44,4% das 1.703 empresas de base tecnológica catalogadas nessa edição do estudo, enquanto aquelas que atuam dentro da propriedade rural representam 41,4% e antes da fazenda 14,2%. 

O estudo identificou ainda que a maioria dessas agtechs permanecem concentradas na Região Sudeste (61,4%), e São Paulo se mantém como o estado com maior número de startups do agro, representando 76,6% do total regional, seguido por Minas Gerais (14,7%), Rio de Janeiro (6,6%) e Espírito Santo (2,1%).

O Radar Agtech Brasil, principal mapeamento do universo de empresas de base tecnológica do setor agropecuário do País, é feito pela Embrapa com a SP Ventures e a Homo Ludens Inovação e Conhecimento, desde 2019, e chega a sua terceira edição nacional com o apoio do Sebrae e da plataforma Distrito.

Para o diretor de Negócios da Embrapa, Tiago Ferreira, o Radar é uma forma de garantir maior visibilidade para as agtechs brasileiras nos ecossistemas de inovação nacional e estrangeiro. “A iniciativa permite gerar subsídios para as ações de fomento e incentivo ao empreendedorismo e inovação, além de estimular parcerias entre startups, com a Embrapa, com o setor produtivo agropecuário e os diversos componentes do ecossistema de inovação, gerando mais valor para o setor agrícola e a sociedade”, destaca o gestor ao explicar que as parcerias com a Embrapa visam ao uso de novas soluções tecnológicas. 

Andresa Berretta, cofundadora da Agrobee, agtech presente no Radar desde 2019, quando a startup foi criada, considera que a presença no Radar fortalece muito a entrada dos novos empreendimentos no universo do agronegócio, além de abrir novas oportunidades de inserção internacional. Um exemplo citado por ela é a participação da startup, via seleção feita pelo Ministério das Relações Exteriores, na conferência Investors Meet Food and Agri Startups 2022 (F&A Next), em Wageningen, na Holanda. A Agrobee foi criada com a missão de promover a integração no campo entre produtores rurais e criadores de abelhas.

“Nossa percepção em relação ao Radar é muito positiva e entendemos que essa é uma iniciativa boa para todos os envolvidos: startups, clientes e para o País como um todo, que ganha com o crescimento das tecnologias desenvolvidas para o agro”, ressalta Berretta.

O CEO e cofundador da plataforma de inovação Distrito, Gustavo Gierun, destaca que apoiar o Radar Agtech é uma forma de documentar a consolidação do ecossistema agtech em um momento fundamental para a agropecuária brasileira, e assim fomentar mais produtividade, qualidade de vida e sustentabilidade para a população brasileira.

Radar 2022


Para esta edição, o Radar seguiu novamente a metodologia aplicada em anos anteriores para levantamento de informações, mapeando startups em base de dados públicas e privadas e realizando, também, coleta de dados a partir de cadastro voluntário de agtechs. Além disso, como explica a coordenadora do mapeamento na Embrapa, Shalon Silva, “foi considerado tanto o universo das startups mapeadas e validadas recentemente e em edições anteriores quanto aquelas identificadas em 2022, o que resultou na validação de 1.703 startups ativas no setor agropecuário e genuinamente brasileiras”, informa a profissional que é supervisora de Ambientes e Inovação da Diretoria de Negócios.

O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) entrou como apoiador nessa edição 2022 do Radar. Com sua ampla base de dados de startups contribuiu tanto para expandir a base de agtechs catalogadas como para qualificar melhor o conteúdo do estudo, a partir de aspectos como tamanho da empresa, quantidade e gênero dos sócios, registro no CNAE, entre outros.

“Vimos no estudo uma grande oportunidade para intensificar sua agenda no segmento do agro. E, indubitavelmente, o Radar Agtech é um expoente de mapeamento maduro para a gente se conectar de forma mais rápida e eficiente com os nossos produtores”, comenta Rodrigo Rodrigues, gerente de Projetos de Inovação do Sebrae Nacional.

Escolha por local ou tipo de agtech


Os dados coletados na pesquisa foram inseridos na Tableau, uma plataforma de Business Intelligence (BI), para permitir fácil acesso e pesquisa. “Nesse sistema, o usuário pode escolher uma cidade e identificar as agtechs existentes, ou escolher um tipo de agtech, por exemplo entre as que atuam dentro da fazenda e fazem análise de solos. Ao identificar as startups de interesse, o usuário pode acessar a página dela na internet, apenas clicando em cima do nome”, explica a pesquisadora Cinthia Cabral da Costa, da Embrapa Instrumentação (SP).

Perfil das agtechs


A análise feita pelo Radar Agtech Brasil 2022 categoriza as startups mapeadas a partir do segmento da cadeia produtiva agropecuária em que atuam: antes, dentro e depois da fazenda, destacando a distribuição dessas empresas por categorias e campo de atuação, o que permite identificar onde estão as principais oportunidades de inserção desses empreendimentos no setor.

O estudo identificou a atuação de 242 agtechs antes da fazenda — com destaque para as categorias crédito/permuta/seguro/análise fiduciária e créditos de carbono (61 empresas) e fertilizantes/inoculantes/nutrição vegetal (53 empresas). Outras 705 trabalham dentro da fazenda – principalmente com sistema de gestão da propriedade rural (173 empresas) e plataforma integradora de sistemas/bases de dados (122 empresas).

São mais 756 agtechs atuando depois da fazenda, a maioria (281 empresas) com alimentos inovadores e novas tendências alimentares e 123 empresas com marketplaces e plataformas de negociação e venda de produtos agropecuários.

O crescimento dessas categorias ganhou maior expressão depois da pandemia da Covid 19, quando ocorreram mudanças significativas nos hábitos dos consumidores, oportunizando a ampliação para plataformas negociais e marketplaces, a adoção de práticas e tecnologias mais avançadas na área de logística. A redução de custos com transportes, prazos, desperdícios de alimentos e outros produtos agropecuários -, e maior taxa de adoção de tecnologias digitais entre os produtores rurais.

A expansão das agtechs também ocorreu geograficamente, embora a concentração dessas empresas mantenha-se, conforme edições anteriores do Radar, nas Regiões Sudeste (1045) e Sul (436), seguidas pelo Centro-Oeste (104), Nordeste (89) e Norte (26). De 349 cidades identificadas no estudo, 26 possuem dez ou mais agtechs. Dessas cidades, 14 são capitais de unidades federativas.

“Considerando a evolução do ecossistema agtech ao longo das edições do Radar, acreditamos que o ecossistema mantenha crescimento e se fortaleça a partir da adoção de soluções de empresas de base digital, nas diversas etapas das cadeias de valor em que atuam, e isso deve ocorrer acompanhado pela atração de mais investimentos de fundos e de empresas nas agtechs”, prevê Luiz Sakuda, co-fundador da Homo Ludens.

Investimentos e tendências em agtechs

Em termos de volume de investimentos, o ano de 2022 foi o mais próspero da série histórica, apesar do cenário econômico instável e com taxas de juros elevadas. Isso levou o mercado a optar por investimentos mais seguros (renda fixa, poupança etc.), em relação a outros mais arriscados — como é o caso da modalidade venture capital (VC).

O contexto resultou no inédito volume de investimentos aplicados em startups de negócios inovadores e ainda em estágio inicial, as categorias seed e pré-seed.

“O mercado brasileiro de venture capital se consolidou como um dos principais da América Latina, o fluxo de capital, mesmo com as oscilações econômicas dos últimos anos, cresce ano a ano, e o investimento em tecnologias para o agronegócio se torna, cada vez mais, protagonista para os investidores nacionais e internacionais”, afirma Felipe Guth, sócio da SP Venture na área de governança e finanças.

O Radar aponta que as principais tendências globais de investimentos para os próximos anos, capazes de resolver grandes problemas do agronegócio tradicional, são os mercados de Insumos Biológicos, Agfintechs, Marketplace para o agronegócio e as novas Climatechs.

As agfintechs, startups que desenvolvem produtos financeiros digitais para o agronegócio, entregando soluções financeiras ao produtor de maneira rápida, não burocrática e com taxas mais acessíveis, tiveram um crescimento composto anual (CAGR) de 47%, entre 2016 e 2021.

As empresas de base tecnológica que realizam a produção e a comercialização de produtos biológicos e colaboram para a maior produtividade e equilíbrio biológico no combate às pragas, as agbiotechs, tiveram um crescimento de mais de 30% no volume investido frente ao ano passado.

Climatechs são empresas que usam tecnologia para promover a redução dos gases de efeito estufa (GEE) e os impactos do aquecimento global e, desde 2010, essa categoria apresenta um CAGR de aproximadamente 28%. No caso dos marketplaces do agro (ambientes digitais nos quais se realizam a compra e a venda de produtos), apresentaram um aumento no valor de investimento de US$ 100 milhões de 2020 para 2021.

Todas essas tendências vêm atraindo grande fluxo de capital em nível global, inclusive na modalidade venture capital (VC), como alerta Francisco Jardim, sócio-fundador da SP Ventures. “O Brasil tem capacidade para atender a todas elas, porque temos instituições promotoras de tecnologias para o agro como a Embrapa e a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP) e startups capazes de desenvolver localmente os desafios necessários a cada um desses setores”, ressalta Jardim.

Participação da América Latina no ecossistema de inovação


Nesta edição, o Radar Agtech apresentou o potencial da América Latina como celeiro mundial, impulsionada pelo ecossistema de inovação e venture capital. A região é protagonista em inovação no setor de agfoodtech, tendo duplicado de tamanho no último ano.

A conectividade dos países da América Latina na área rural é 30%, mais de 25% da economia é concentrada no agronegócio, o PIB é de mais de US$ 5 trilhões, com Brasil, México, Argentina, Chile e Colômbia, representando cerca de 80% do PIB da região.

Um potencializador do desenvolvimento da tecnologia é o ritmo acelerado com que os latinos-americanos se conectam, a penetração da internet já atinge 78% da população, índice que supera o da China.

A análise é que, para suprir o desequilíbrio regional de investimentos, as tecnologias deverão advir das startups agfoodtech, em grande parte financiadas pelo venture capital que em 2021 atingiu US$ 15,7 bilhões na América Latina, um recorde, o que representa três vezes mais que em 2020, quando o valor foi de US$ 4.2 bilhões.

Já o setor de agtechs e foodtechs apresentou crescimento na maior parte dos países, tanto em número de novas rodadas de investimento como nos valores investidos. Três fundos de investimento em venture capital da região, Glocal (Argentina), MatterScale A (Colômbia) e Amplifica Capital (México), apresentaram um panorama da pujança, potenciais oportunidades e sinergias do setor de agfoodtech na América Latina, além do Brasil.

A síntese é de que há um movimento constante e de crescimento de investimentos em startups de agfoodtechs, sendo o Brasil o epicentro desse movimento na região, com mercado agro de forte representatividade na economia, somado a uma relevante produção de conhecimento acadêmico, capaz de impulsionar o desenvolvimento de tecnologias para o agronegócio.

Com a proposta de fomentar a abertura de novas oportunidades de soluções inovadoras para a agropecuária na América Latina, a Embrapa coopera com o Programa StartOut Brasil do governo brasileiro, que apoia a inserção de startups nos mais promissores ecossistemas de inovação do mundo. Desde a criação em 2017, o programa já realizou 12 ciclos de internacionalização em nove países e atendeu mais de 221 startups.

A Embrapa ainda apoiou outras iniciativas no âmbito do Tech Mentorship em 2020, na Colômbia e, em 2022, no Chile, além de ser realizadora do Latam Challenge, executado por meio de acordo de cooperação com a empresa norte-americana Thriveby SVG Ventures, sediada no Vale do Silício, na Califórnia, e coordenado pelo Labex Estados Unidos, ocorrido em 2021.

Ecossistemas regionais de inovação agrícola


Um mapeamento realizado em todo o território nacional apontou que a Embrapa interage atualmente, por meio de suas Unidades, em 42 hubs de inovação regionais voltados ao agro brasileiro, e com potencial de ampliar as soluções tecnológicas geradas pela pesquisa agropecuária e levá-las mais rapidamente ao mercado.

Esses ecossistemas regionais ou hubs de inovação regional podem ser vistos como um emaranhado de instituições que trabalham em prol da inovação no setor, a partir de redes de interações entre diversas categorias de atores, com a formação de arranjos colaborativos e novos modelos de negócios. Eles têm o papel de sensibilizar e conectar os produtores rurais aos benefícios promovidos pelas tecnologias digitais nas fazendas, a exemplo daquelas que proporcionam menor impacto ambiental.

Para as agtechs, fazer parte de ecossistemas regionais ou hubs de inovação regional representa a possibilidade de ter acesso tanto a processos de incubação, mentoria, aceleração, trabalhar com novas tecnologias e codesenvolver com a Embrapa, como a investimentos.

Uma iniciativa recente para apoio e fortalecimento dos ecossistemas regionais de inovação agropecuária é o programa AgroHub Brasil, criado em julho deste ano pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

O objetivo é a criação e amadurecimento de startups por meio de eventos e desafios, oferta de oportunidades de captação de recursos públicos e privados em âmbitos nacional e internacional, bem como aproximar desenvolvedores de tecnologias de seus potenciais usuários.

Fonte: www.noticiasagricolas.com.br